quarta-feira, 23 de julho de 2014

o problema é eu não ser um ice tea de manga?



Quero um ice tea de manga, porque o de pêssego é muito doce e o de limão é muito ácido, dizias. Eu não gosto de ice tea de manga. Nisso nunca fui como tu. Eu gosto do doce e do ácido, não gosto de me ficar pela metade, pelo mais-ou-menos, pelo nem-é-isto-nem-é-aquilo. Eu ou sou oito ou sou oitenta. Em relação a ti, sou igual. Ou te amo como nunca vou amar ninguém na vida, ou não me lembro que tu existes. Ridículo, eu sei, repito-o a cada cigarro apagado no cinzeiro que compraste para nós. Aquele cinzeiro em forma de coração que trouxeste da tua viagem a Madrid, mesmo sabendo que nenhum de nós fuma, e que ele ia estar sempre vazio, disseste-me ternurento que era para guardar o que sobrava do nosso amor. Agora já não sobra nada, já não há o nosso amor. Por isso decidi enchê-lo com as beatas dos cigarros que fumo a pensar em ti. Sei que odiarias se soubesses que comecei a fumar. A culpa é tua. Deixaste a minha vida vazia. Agora preencho-a com maços de cigarro, garrafas de tequila e folhas amarrotadas no canto da sala cheias de tóxicas palavras. Ando a intoxicar-me, a ver se me destoxifico do amor que ainda sinto por ti. Chama-se homeopatia. Curar-me com o veneno que quase me matou. Tóxico para tóxico. Não sei se vai resultar ou se um dia o meu coração não aguenta o pesar da vida e deixa de bater. Se um dia deixar de bater, não te apoquentes. A minha avó sempre me disse de grandes males quando não se morre da doença, morre-se da cura. Não foste tu que me mataste, fui eu a tentar curar-me de ti. Não tens culpa de ter prendido um coração como o meu. Um coração de oito a oitenta. Hoje sou oitenta, oro para que amanhã acorde sendo oito. Overdose não é a melhor forma de se morrer. Muito menos uma overdose como esta, de amor.

domingo, 2 de fevereiro de 2014

és o meu mais-do-que-mereço


Sou um ser extremamente estranho. Desejo, profunda e secretamente, que alguma coisa corra mal entre nós e que seja a vida a pôr o ponto final que um dia vamos precisar de pôr. Tudo porque temo que tu não o faças e eu... eu simplesmente odeio pontos finais, principalmente quando sou eu a desenhá-los. Tu és das melhores pessoas que já conheci na vida. Sabes fazer-me sorrir. Sabes respeitar a minha vontade. Sabes quando quero apenas o teu colo ou quando estou com a pica toda para qualquer brincadeira que surja. Já me conheces, mesmo pouco sabendo, na verdade, sobre a minha vida. Sabes o suficiente, digo-me. Sabes o que tens que, podes e deves saber. E mesmo assim sei que as coisas não vão nunca dar certo. Porque és bom demais. E eu preciso de alguém que volta e meia me abane o coração. Estás a ver o quão estranha eu sou? Mereces, definitivamente, melhor que eu. Deves ser o único. Deves ser o único, desde sempre, que eu acho que merece melhor que eu e que na verdade não mostra vontade de o procurar. Posso estar enganada. Oh, que a vida queira que eu esteja enganada. Não quero fazer o papel de parte-corações. Já estive desse lado e sei o quanto dói. Nunca te escondi o que pretendo com isto, ou melhor, o que não pretendo, mas eu sei como é fácil alimentar esperanças e rezo, rezo todos os dias, para que isso não esteja a acontecer contigo. Porque por enquanto é bom, mas vai deixar de ser. E eu, tu, ou a vida... alguém vai ter que pôr o ponto final e, sinceramente, só espero que o tempo possa voltar atrás e que fique eternamente entre nós o carinho do fio de tradição académica que nos une. Porque és um bom afilhado, e eu quero muito continuar a ser uma boa madrinha. Como quero eu que as coisas dêem erradas com uma pessoa como tu? Não me perguntes. Repito que sou um ser extremamente estranho. Se gosto? Não. Na verdade, odeio. Odeio-me. Odeio ser assim. Odeio, do fundo do coração. Mas ainda não encontrei os meus botões reguladores de personalidade, resta-me aceitar que eu só desejo o que não me deseja, e só amo o que não me ama. 
De qualquer forma, obrigada, mesmo, por tudo, mais-do-que-eu-mereço. 

segunda-feira, 25 de novembro de 2013

Vem ser feliz comigo


Só sentia as folhas a estalar por baixo das minhas botas felpudas, o meu cabelo (já enorme, mais uma vez) a voar, enquanto eu ajeitava o cachecol e apertava o casaco para o frio não me gelar... e pensava no quanto queria que me acompanhasses neste Outono, e no Inverno que chega a passos largos. Eu a desejar o peso dos teus braços bem compostos, com os biceps bem definidos, nos meus ombros, enquanto me agarravas o nariz em jeito de brincadeira e sorríamos porque juntos a vida era menos fria. Tu pensas nisso? Tens saudades da minha voz a aquecer-te a orelha nos sussurros que trocávamos, como eu tenho da tua, ou já te esqueceste daquilo que fomos? Da forma como me corrias nas veias e de como o meu coração te bombeava para todas as minhas células, para que nenhuma se esquecesse que és elemento crucial à vida e que sem ti as mutações são constantes. E já não há células a sorrir em mim; daquelas em que as mitocôndrias se uniam para formar um sorriso e os lisossomas formavam os olhinhos que pareciam brilhar. Hoje, só existem células com mutações coraçómicas, porque lhes falta o corassoma crucial à vida, que és tu. E sem ti não existe amor, nem células a sorrir, nem Outono e Inverno que parecem Primavera e Verão. Sem ti só existe a vida como ela é, e eu como nunca quis ser. Continuo no mesmo sítio de sempre, à tua espera. Volta, aquece-me os pés e deixa-me aquecer-te as mãos. Vem ser feliz comigo.

domingo, 17 de novembro de 2013

cair no esquecimento


Às vezes gostava de ser uma molécula de oxigénio. Porquê, perguntas tu. Resposta fácil, decorada na ponta da língua como acontecia com a tabuada na escola primária: para entrar no teu coração. Apanhar boleia do teu sangue, conhecer-te as entranhas usufruindo da vista privilegiada das artérias, não gosto dos capilares porque são apertados, e quando chegasse ao coração ia agarrar-me com força, até conhecer cada canto dele. Explorar cada aurícula e cada ventrículo. Procurar-me lá. Ver se me guardas em alguma gaveta, se preferes ter-me pendurada no endotélio ou se não me tens lá, simplesmente. Queria vasculhar as tuas memórias, saber onde estão os teus medos e se eu entro nos teus sonhos. Queria olhar para mim e ver-me como tu me vês. Sim, eu acredito que me encontraria lá, nem que fosse em formato pequeno, mal tratada e esquecida num canto qualquer. Eu sei que de uma maneira própria tua, desconhecida minha, eu te abalei o coração. Caso contrário, as coisas tinham sido diferentes e tu não tinhas feito nada do que fizeste por mim. A diferença está na velocidade com que vais deixar que eu saia daí, se vais deixar. Eu tenho medo que me esqueças num piscar de olhos e que eu me lembre sempre de ti. Tenho medo de um dia me cruzar contigo na rua e sentir que fazes parte de mim, porque sou assim mesmo com todo o meu passado, e que tu... que tu nem do meu nome te lembres. E sabes porque tenho medo? Porque sei o quão isso é provável. Dei-te mais do que merecias, isso nunca marca ninguém. Era isso que queria descobrir no teu coração. 

terça-feira, 12 de novembro de 2013

mundo de sonho(s)


Pensei que o coração a bater mais rápido era só o álcool a correr-me nas veias, mas estava enganada. Era a nossa música, na nossa cidade, no nosso dia e só faltavas tu. E parecendo que não (pelo meu sorriso estonteante de quem intoxica as mágoas nas garrafas) és a peça principal do puzzle que é a minha vida. Faltavas, disse bem. Faltavas porque apareceste. Sempre lindo. Homem de poucos risos, mas de muitos sorrisos. Quis ignorar o exército de memórias que se preparava para me atacar, por isso comecei a soltar os disparates do costume - adoro ver os meus amigos rir, isso deixa que o meu coração se alimente do sorriso deles. E tudo estava bem, eu a ignorar-te, tu feliz, e o exército bloqueado. Até tu alterares o equilíbrio que a Natureza criou para nós e a tua mão no meu ombro congelar tudo em mim, e aí, nem o vinho todo que tinha bebido em memória de nós, num brinde aos meus amigos, me valeu para me segurar firme. Olhei para ti e só me fizeste um gesto ao de leve com a cabeça como quem implorava que te seguisse. Os teus olhos não sorriam como era normal, isso preocupou-me. Fui então. Segui-te. Sempre atrás de ti, sempre a pensar que se te tocasse me desfazia. Elaborei mil questões mentalmente para estares a fazer aquilo, depois de tudo. E nenhuma acertou na mouche. Mal abriste a boca, baixei os olhos, e ouvi-te dizer que não aguentavas mais ver-me feliz sem ti. Quis rir-me na tua cara. Eu, feliz, sem ti, são palavras que não podem coexistir na mesma frase. Mas não refutei, deixei-te falar. E falaste. Falaste mais do que alguma vez eu tinha assistido. Não abri a boca uma vez e no entanto sinto que ainda falei mais que tu, em cada lágrima que viste cair-me da cara. Já te via desfocado, das lágrimas, pensava eu. Até acordar, na minha cama, como se tudo fosse um sonho. E se calhar foi, ou então não. Nunca saberei a verdade nem nunca mais te falarei. E o único sempre que existirá entre nós, na verdade, é só meu. É que sempre te amarei.

segunda-feira, 11 de novembro de 2013

corações feitos de dor


Sempre me gabei de ter um coração de carne, que ainda cheio de espinhos continuava inteiro, e a bater. Depois de hoje, já não sei de que são feitos os corações reais. Um coração de carne não se desfaz como se fosse um coração de puré. Ainda que a situação seja amarga para a alma, carne é carne, puré é puré, e os corações são feitos de uma matéria estranhamente invulgar capaz de ter o comportamento dos dois. Sou contra. Sou capaz de criar um abaixo assinado contra este tipo de tecido. Não é de qualidade e a segurança dos Humanos fica permanentemente em risco, dado que estamos a um passo de ver o nosso coração desfeito e sem forças para se juntar. Não é justo, nem viável. Não vivemos num mundo encantado onde não é preciso tomar precauções contra enfermidades da alma e do coração. Com um coração feito disto é impossível precavermos uma desgraça, é difícil controlar o desespero só em pensar que um dia podemos ter o nosso coração feito puré pronto a ir para o lixo porque já ninguém o quer e o prazo de validade é pequeno. Mais valia um coração de vidro, ou até de pedra, que fosse. Eu a dizer que prefiro um coração de pedra (que desprezo) a um coração de puré. É só que é preferível não sentir a sentir que somos um nada perante a vida. Porque somos... e eu sei disso, mas não o quero sentir na pele, melhor, no coração. Não quero sentir que ele se decompõe à velocidade da luz e acaba numa infinidade de partículas que já não conseguem ser mais nada, partículas onde a compactação já não é possível e o remédio é aprender a viver com um coração feito de pedacinhos de batata. Como se aprende a viver assim? Não sei. E acho que só quem lá passa sabe, por isso quero ficar na ignorância toda a vida, por favor. Chega ver algum dos meus assim e não poder fazer nada, juro que chega.

domingo, 10 de novembro de 2013

hora de retomar a viagem


São engraçadas as voltas que o destino dá. Logo depois de ter construído esta casa nova, fui capaz de perder a chave dela. Pensei só que não a merecia e que a minha escrita estava mesmo bem era escondida do mundo, nas gavetas do meu quarto, guardada em papeis amarrotados. Pensei isso até hoje. E até hoje não escrevi mais para ninguém ver. Até hoje, porque foi o dia de o destino trocar as voltas e eu reencontrar a chave desta casa. Talvez eu tenha só precisado de me afastar mais uns tempos, talvez só agora eu esteja pronta para abraçar uma nova casa sem reservas, ou talvez isto não queira dizer nada e eu esteja só a delirar como é já costume. Para mim tudo tem um sentido na vida, e quando não tem eu sou boa a inventá-lo. Não gosto de coisas desencaixadas da vida, não gosto de sentir que há algo que não tinha que acontecer porque não significa nada. Deus é grande e sabe o que faz no nosso mapa da vida. Eu acredito nisto.
E cá estou eu. Não sei até quando, se dá tempo de desencaixotar todos os sentimentos ou se só vale a pena limpar o pó das caixas-do-coração-que-guardam-as-palavras. Mas não quero saber, quero só aproveitar cada canto desta nova casa e não deixar nada por escrevinhar nas paredes dela. Quando for hora de a deixar, e se chegar essa hora, então saberei que já a vivi como tinha de viver. Já dizia Fernando Pessoa que a valor das coisas não está no tempo que elas duram, mas na intensidade com que acontecem